Mediação Empresarial: alguns benefícios encontrados na prática
São várias as vantagens decorrentes da mediação. Aqueles que já participaram de resolução de conflitos por esta via já os identificaram. O desafio é apresentar isso para aqueles que ainda não o vivenciaram.
As pesquisas empíricas permitem olharmos a realidade, compreendermos o que está acontecendo e buscarmos entender como será o futuro e o que poderá ser feito de forma diferente. Com o intuito de obter dados reais do mundo empresarial e estudar alguns desses benefícios da mediação nesta área, foi feita uma pesquisa no âmbito das varas empresariais do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entre os meses de janeiro de 2016 a dezembro de 20171.
Sobre a Pesquisa2
Foram analisadas 397 ações judiciais envolvendo questões empresariais3 e despachadas durante os anos de 2016 e 2017 para o Centro Justiça e Cidadania da Comarca do Rio de Janeiro (CEJUSC-Capital, localizado no Beco da Música, 121, sala T06, Centro, Rio de Janeiro/RJ) que realiza mediação judicial, inclusive para as varas empresariais. O TJ/RJ é o segundo em termos de quantidade de processos judiciais, sendo São Paulo o primeiro4.
Um dos motivos para a escolha deste período foi a determinação da mediação judicial (art. 334) no Código de Processo Civil Brasileiro5. E uma das razões para a pesquisa ser realizada no âmbito empresarial é que a tomada de decisão para encerrar o conflito está baseada na racionalidade, podendo ser utilizada a Teoria dos Jogos e o Dilema do Prisioneiro.
Quais os benefícios estudados?
No cenário empresarial também podemos perceber vários benefícios da mediação. Como destacado pela Daniela Gabbay6: “A escolha da mediação empresarial é estratégica e depende dos objetivos e interesses de cada parte”. A árvore da decisão7 pode auxiliar os envolvidos a identificar se a mediação é de fato o meio mais adequado para a resolução do conflito.
a) Celeridade e Atendimento dos Interesses Mútuos
A pesquisa indicou que o movimento inicial para a mediação judicial não foi feito pelas partes, mas em decorrência do fluxo processual (principalmente com base nos arts. 334 e 139, V do Código de Processo Civil8). Assim, não é possível verificar se de fato as partes possuíam o real ânimo de querer participar de uma mediação e se este meio era verdadeiramente o mais adequado. Independentemente disso, em 19,14% dos processos analisados, as partes fizeram acordo. Em 0,25%, o acordo foi parcial. E o tempo médio para resolução do conflito: na ação judicial, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, cerca de 5 anos9. Na mediação judicial (contado da distribuição da ação judicial até a elaboração do acordo pelas partes na sessão de mediação): 1 ano. Na mediação empresarial extrajudicial, este tempo é ainda menor: aproximadamente 1 mês.10
b) Efetividade dos Resultados
Em 58,9% dos processos em que houve acordo, o cumprimento deste foi integral. Em 3,6%, houve cumprimento parcial do acordo. E em 30,4% não houve de fato o cumprimento.
Para este último dado, lembramos que como há homologação pelo juiz do acordo (aproximadamente 1 mês após a celebração)11 realizado em mediação, a parte agora tem em seu poder um título executivo judicial para a fase da execução.
c) Fluidez na comunicação
Um dado bastante interessante percebido foi com relação à comunicação. Discute-se a identificação do “sucesso/êxito” da mediação. Seria necessária a realização do acordo na mediação? Seria possível caracterizar como exitosa uma mediação em que as partes retomaram o diálogo, mas não obtiveram um acordo durante as sessões. Percebe-se que, de fato, isto ocorre na realidade: 2,27% dos acordos foram realizados após a fase da mediação ser encerrada.
d) Redução do custo financeiro
Há alguns anos já se discute a análise econômica do Direito aqui no Brasil12. Recentemente, Felipe Antonio Farah Morales e José Bento Vasconcellos Armond, em um artigo13, fizeram a análise econômica da mediação, apresentando os estágios dos custos de transação [i) negociação; 2) localização; e 3) execução]. Wilson Pimentel detalha esse acesso responsável à Justiça14. Outros autores debatem a análise econômica do processo judicial15. A escolha pela mediação empresarial extrajudicial passa exatamente por essa análise econômica que, quando as três formas de resolução de conflitos são comparadas: processo judicial com uma decisão do juiz, mediação judicial e mediação extrajudicial, observa-se que os custos na mediação extrajudicial são menores, pois (a) o tempo de duração do conflito é menor (consequentemente não há custos gastos para a manutenção/acompanhamento do processo judicial16), (b) não há risco (a decisão do juiz – terceiro – é um risco a ser incluído na análise), (c) o acordo não envolve necessariamente dinheiro (outros valores podem compor este acordo, desde que todos os envolvidos concordem. 44,6% dos acordos não envolveram pagamento em dinheiro) e (d) na mediação as partes podem escolher o terceiro que auxiliará na resolução do conflito. O art. 168 do Código de Processo Civil prevê essa possibilidade na mediação judicial, mas a pesquisa indicou que 100% da escolha do mediador foi feita pelo próprio Poder Judiciário. Na mediação extrajudicial, as partes efetivamente escolhem o mediador.
Conclusão
A tomada de decisão para eleição da mediação é estratégica, mas observa-se que dados são necessários para dar o suporte adequado ao tomador dessa decisão. A mediação empresarial vem se desenvolvendo no Brasil, como demonstrado na pesquisa da Daniela Gabbay17. E esta pesquisa realizada no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro corrobora os vários benefícios da mediação também no cenário empresarial. A mediação empresarial extrajudicial desponta como a mais economicamente vantajosa (quando comparada com a mediação judicial e o processo judicial – decisão do terceiro/juiz), auxiliando na fluidez da comunicação entre os envolvidos, trazendo a efetividade no resultado final (acordo) exatamente por ter atendido aos benefícios mútuos das partes e por ter sido mais célere. Outras pesquisas (principalmente empíricas) são necessárias para que seja possível termos mais dados que possam ajudar o tomador de decisão/empresário na escolha pela mediação empresarial extrajudicial e possamos de fato promover uma mudança de paradigma.
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1 A pesquisa completa realizada no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro serviu para obtenção do doutoramento da autora.
2 Outros dados desta pesquisa foram apresentados no VI Congresso Brasileiro de Arbitragem e Mediação Empresarial, servido como base para o artigo a ser publicado na revista do CONIMA intitulado: O PODER JUDICIÁRIO E A MEDIAÇÃO EMPRESARIAL: UM ESTUDO EMPÍRICO NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
3 Lei 6.956/15. DISPÕE SOBRE A ORGANIZAÇÃO E DIVISÃO JUDICIÁRIAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS – Seção XIII Dos Juízos de Direito em Matéria Empresarial. Art. 50 Compete aos Juízes de Direito em matéria empresarial: I – processar e julgar: a) falências, recuperações judiciais e os processos que, por força de lei, devam ter curso no juízo da falência ou da recuperação judicial; b) execuções por quantia certa contra devedor insolvente, bem como pedido de declaração de insolvência; c) ações coletivas em matéria de direito do consumidor, ressalvadas as que tratarem de matéria de competência exclusiva do Juizado do Torcedor e Grandes Eventos; d) ações relativas a direito ambiental em que sociedade empresarial for parte, à exceção daquelas em que for parte, ou interessado, ente público ou entidade da administração pública indireta; e) as ações relativas ao direito societário, especialmente: 1- quando houver atividade fiscalizadora obrigatória da Comissão de Valores Mobiliários; 2- quando envolvam dissolução de sociedades empresariais, conflitos entre sócios cotistas ou de acionistas dessas sociedades, ou conflitos entre sócios e as sociedades de que participem; 3- liquidação de firma individual; 4- quando envolvam conflitos entre titulares de valores mobiliários e a sociedade que os emitiu, ou conflitos sobre responsabilidade pessoal de acionista controlador ou dos administradores de sociedade empresarial, ou, ainda, conflitos entre diretores, membros de conselhos ou de órgãos da administração e a sociedade; f) ações relativas a propriedade industrial, direito autoral e nome comercial; g) ações em que a Bolsa de Valores for parte ou interessada; h) ações relativas a direito marítimo, especialmente as de: 1. indenização por falta, extravio ou avarias, inclusive às relativas a subrogações; 2. apreensão de embarcações; 3. ratificações de protesto formado a bordo; 4. vistoria de cargas; 5. cobrança de frete e sobrestadia; 6. operações de salvamento, reboque, praticagem, remoção de destroços, avaria grossa; 7. lide relacionada a comissões, corretagens ou taxas de agenciamento de embarcação; i) ações diretamente relacionadas às sentenças arbitrais e que envolvam as matérias previstas neste artigo; j) as ações diretamente relacionadas à recuperação de ativos desviados de sociedades empresariais em razão de fraude e/ou lavagem de dinheiro; II – cumprir precatórias pertinentes à matéria de sua competência.
4 Justiça, C. N. de. (2018). Justiça em Números. Brasília. Disponível aqui.
5 CPC foi promulgado em 2015, mas só entrou em vigor em março de 2016 (art. 1045).
6 “Mediação empresarial em números: onde estamos e para onde vamos”
7 Sugestão de leitura para preenchimento da árvore de decisão pelos advogados para auxiliar seus clientes na tomada de decisão: JACKSON, H., KAPLOW, L., SHAVELL, S., VISCUSI, W. K. and, & COPE, D. (2003). Analytical Methods for Lawyers. (2nd, Ed.).
8 Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência. Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;
9 Justiça, C. N. de. (2018). Justiça em Números. Brasília. Disponível aqui.
10 “Mediação empresarial em números: onde estamos e para onde vamos”
11 100% dos acordos realizados nas sessões de mediação foram homologados pelo juiz competente.
12 Antônio Maristrello Porto, Luciano Benetti Timm, Nuno Garoupa, dentre outros
13 “A mediação é o método mais eficiente para resolver conflitos? Uma análise econômica”
14 Em seu livro: Acesso Responsável à Justiça, 2019, Ed. Lumen Juris.
15 Bianca Bez Goulart, Bruno Bodart e Luiz Fux, Erik Navarro Wolkart, Ivo Gico Jr., dentre outros.
16 Estudos realizados em 2014 e 2016 – Custo das Empresas para Litigar Judicialmente – Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – https://ibpt.com.br/ -Amaral Yazbek Advogados
17 “Mediação empresarial em números: onde estamos e para onde vamos”
Por Cristiane Dias Carneiro, Doutora em Administração Empresarial pela Rennes School of Business. Mestre em Direito e Economia pela Universidade Gama Filho. Advogada no Rio de Janeiro. Autora de artigos sobre arbitragem e mediação. Professora convidada no LLM em Direito do FGV Law Program. Mediadora certificada pelo ICFML – Instituto de Certificação de Mediadores Lusófonos.
Fonte: Migalhas, quinta-feira, 17 de março de 2022.
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